14 out Prestação de Contas Advogado
Apelação Cível n. 2008.015391-0, de São José
Relator: Des. Sérgio Izidoro Heil
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. APLICABILIDADE DO PRAZO VINTENÁRIO PREVISTO NO ART. 177 DO CC/1916. PRESCRIÇÃO INOCORRENTE. RECEBIMENTO DE ALVARÁ PELO RÉU EM NOME DA AUTORA, NA CONDIÇÃO DE ADVOGADO. ASSERTIVA DE QUE A REQUERENTE JAMAIS RECEBEU A QUANTIA. PLEITO DE SATISFAÇÃO QUANTO AO DESTINO DADO AO MONTANTE RECEBIDO. REQUISITOS DO ART. 914 DO CPC DEVIDAMENTE PREENCHIDOS. PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2008.015391-0, da comarca de São José (1ª Vara Cível), em que é apelante Irivaldo
Medeiros, e apelada Angelica de Souza Rosar: A SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR VOTAÇÃO UNÂNIME, CONHECER DO RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO. CUSTAS LEGAIS.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Luiz Carlos Fresyesleben, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Subst. Saul Steil.
Florianópolis, 27 de outubro de 2011.
Sérgio Izidoro Heil
RELATOR
RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto por Irivaldo Medeiros contra sentença proferida pela Juíza de Direito da 1ª Vara Cível da comarca de São osé que, nos autos da ação de prestação de contas n. 064.06.018301-6, ajuizada por Angélica de Souza Rosar, julgou procedente em parte o pedido para condenar o réu a prestar contas acerca dos valores recebidos no alvará n. 2139/93, sob a forma contábil, além do pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 1.000,00 (mil reais) (fls. 105/110).
Aduz, em suma, que: ocorreu a prescrição da pretensão da autora; patrocinou os interesses da recorrida em ação desapropriatória indireta contra o
antigo DNER; nunca recebeu os honorários da recorrida, tendo inclusive ajuizado contra ela ação cautelar inominada e execução por quantia certa; a recorrida recebeu vários alvarás quando seus filhos atuavam no processo como procuradores; o valor que a recorrida lhe deve, corrigido até 4.4.2005 é de R$ 14.253,79; cinco anos após a expedição do alvará em questão a requerida firmou novo contrato de honorários com o apelante; somente após o recorrente postular em juízo os honorários que lhe são devidos a recorrida intentou a presente ação.
Contra-arrazoado (fls. 123/129), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.
VOTO
Insurge-se o apelante contra sentença proferida pela Juíza de primeiro grau, que julgou procedente em parte o pedido da apelada nos autos de ação de prestação de contas.
In casu, pretende a autora a condenação do réu à prestação de contas sobre alvará expedido em 29.9.1993 e recebido por este em nome daquela na condição de advogado.
Primeiramente, a alegada prescrição da pretensão da autora não está a merecer amparo. Tendo o alvará em questão sido expedido em 29.9.1993 e a presente ação ajuizada em março de 2006, vejo que não ocorreu o prazo prescricional vintenário estabelecido pelo art. 177 do Còdigo Civil de 1916, aplicável à hipótese. Consoante o art. 2.028 do Código Civil de 2002, não se aplica o prazo de dez anos
previsto neste Diploma quando for reduzido o lapso previsto na legislação anterior.
Neste sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PRIMEIRA FASE. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E CARÊNCIA DA AÇÃO REFUTADAS. “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. INTERESSE DE AGIR. EXISTÊNCIA. PEDIDO GENÉRICO. NÃO OCORRÊNCIA. (…) PREJUDICIAL DE MÉRITO. PEDIDO DE APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DE 3 ANOS PARA A SEGUNDA FASE. PRAZO DE 10 ANOS. AFASTADA A PREJUDICIAL.
A ação de prestação de contas, de cunho pessoal, prescreve em dez anos, nos termos do artigo 205 do Código Civil, ou em vinte anos, se o contrato for firmado sob a égide do Código Civil de 1916, artigo 177. (AC n. 2009.027484-6, de Concórdia, rel. Des. Eduardo Mattos Gallo Júnior, j. 16.9.2011).
Desta feita, afasto a alegada prescrição.
Quanto ao mérito dispõe o art. 914 do CPC: “A ação de prestação de contas competirá a quem tiver: I – o direito de exigi-las; II – a obrigação de prestá-las”.
Na lição de Adroaldo Furtado Fabrício, “significa fazer alguém a outrem, pormenorizadamente, parcela por parcela, a exposição dos componentes do débito e crédito resultantes de determinada relação jurídica concluindo pela apuração aritmética do saldo credor ou devedor ou sua inexistência” (Comentários ao CPC. V. VIII. T. III. p. 387/ 388).
O procedimento especial da prestação de contas provoca o desdobramento do objeto processual em duas questões. A primeira – estágio em que
se encontra o presente processo – , diz respeito à análise da existência ou não do dever da parte ré em prestar contas, sendo esta prejudicial para o conhecimento da segunda etapa, relacionada à demonstração efetiva das contas, apurando-se eventual quantum de débito ou crédito.
In casu, conforme já esposado na análise da prescrição, o dever de prestação de contas do apelante à apelada é indiscutível, dada a relação decorrente de outorga de mandato existente entre eles. O apelante atuou como causídico da apelada em ação de desapropriação indireta contra o DNER, perante Justiça Federal, sendo de sua inteira responsabilidade prestar satisfações acerca de alvará expedido e cujo valor, afirma a apelada, não lhe foi entregue.
O fato de a apelada ter inadimplido contrato de honorários advocatícios firmado com o apelante não retira deste o dever de prestar contas, até porque o valor que reputa devido pela apelada seria de R$ 14.253,79, enquanto que o alvará foi recebido no montante de R$ 63.753,00.
Sobre a matéria, já decidiu esta Corte:
Apelação cível. Ação de prestação de contas. Procuração outorgada pela autora ao réu, com o objetivo de ingressar com ação previdenciária. Recebimento pelo requerido dos valores atinentes à concessão do benefício de aposentadoria por idade. Dever do mandatário de prestar contas, diante de dúvida da autora quanto ao depósito da quantia devida. Artigo 668 do Código Civil de 2002. Direito da requerente exigir as aludidas contas, nos termos do artigo 914, inciso I, do Código de Processo Civil. Alegada não observância do artigo 915, § 1º, do CPC afastada. Apresentação, tão somente, de singelo demonstrativo de atualização monetária do mencionado montante e indicação unilateral dos descontos efetuados na referida soma. Ausência de documentos justificativos. Insuficiência. Obrigação não satisfeita. Necessidade de prestar as contas na forma mercantil. Artigo 917 do Código de Processo Civil.
Decisum mantido. Recurso desprovido. (AC n. 2009.055757-5, de Canoinhas, rel. Des. Ronaldo Moritz Martins da Silva, j. 28.7.2011).
Ainda:
APELAÇÃO CÍVEL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CONTRATO VERBAL DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. ARTS. 330, I, E 915, § 2°, DO CPC. RECURSO DESPROVIDO.
Se a sentença apresentou fundamentos suficientes para a procedência do pedido inicial, não será uma audiência preliminar (art. 331, do CPC) que modificará o convencimento do julgador. Afastado o pedido de cassação do decisum. O advogado é obrigado a prestar contas ao cliente por quantias recebidas no processo, sob pena de cometer infração disciplinar que autoriza suspensão da atividade profissional (2º TACivSP, 2ª Cam. APC/Rev 564022-00/7, rel. Juiz Felipe Ferreira, j. 13.12.1999, DOE-SP, Poder Judiciário, 29.4.2000, p. 119). (AC n. 2006.021135-7, da Capital, rel. Des. Edson Ubaldo, j. 30/09/2010).
Sendo assim, resta clara a relação jurídica havida entre as partes, que obriga o apelante a prestar contas à recorrida, a teor do que dispõe o art. 914 do CPC.
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do apelo, afastar a prejudicial de mérito e negar-lhe provimento.